Porque o tempo não para, nos tornamos velhos? - Restauração de fotos Marcelo Fradim
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Porque o tempo não para, nos tornamos velhos?

Time and direction

“A principal patologia da velhice é a nossa ideia da velhice” James Hillman

Ao defender o envelhecimento como processo de viver, não raro, eu escuto: “você diz isso porque não é velho”. Será que não sou velho? O que é preciso para ser velho? Para ser velho é necessário ter certa idade? Ser novo é melhor do que ser velho? Ser velho é estar ameaçado pela morte? Será que estamos enganados sobre o tempo?

Ninguém pode escapar do processo natural do envelhecer, como nenhum humano pode voar por si mesmo porque não é natural voar. Nascemos com escápulas, mas elas não se desenvolveram para o vôo, ficaram presas ao tronco. Essa é a nossa natureza. Como todos nós sabemos (mesmo que o nosso inconsciente não acredite) iremos morrer indubitavelmente. Sendo assim, ninguém pode viver sem experimentar a travessia, pois viver é fazer passagem.

O tempo cronológico é objetivo, referenciado em números, contável. Sem dúvida, um número não traduz as idiossincrasias de um ser humano, mas a organização de uma sociedade requer ordem, certeza, constância, hierarquia. Nossa sociedade, por exemplo, foi construída na premissa de “ordem e progresso”, como está escrito na bandeira nacional. O positivismo lógico da expressão mostra que sem ordem não há progresso. Em termos lógicos é possível entender a expressão, porém no que diz respeito ao humano, à vida, ficamos distantes de uma asserção coerente.

Para evoluir são necessárias novas alternativas. Por isso, sem renovar o aprendido continuaremos repetindo. Com a repetição nada se cria, tudo se copia. Porém tudo continua sendo o que sempre foi. Assim, podemos dizer que estar dentro das cercanias da ordem com relação às pessoas acima de 60 anos de idade é manter a idéia de que o velho é velho, problemático e pronto. Nunca saberemos o que fazer com eles. Será preciso saber o que fazer com eles? Isso é poder como dominação e não poder como possibilidade. O diálogo aberto é o caminho para o poder como possibilidade. Quando podemos por meio de nosso poder gerar poder no outro, formamos uma cascata interminável de feitos importantes para a sociedade.

“Durante a nossa juventude, estamos muito voltados para a vida externa. Temos obstáculos no trabalho, na família, e aí vamos vencendo, rompendo com as barreiras, e se vangloriando com as vitórias. Quando chegamos na velhice, nós temos que enfrentar um dos maiores desafios: o encontro com nós mesmos. É nesse momento que vamos nos encontrar de verdade, vamos nos conhecer. Olhamos face a face para nós. Não é agradável este encontro. Algumas vezes fico pensando se eu não tivesse feito isso ou aquilo como teria sido a minha vida […] O tempo é impossível de ser captado. Só quando a gente vê um rapazinho que conhecíamos quando criança, que percebemos que o tempo passou depressa.

Toda palavra vem carregada de valores, baseando-se em relações contrastivas. Se o moderno é bom o obsoleto é ruim, se o antigo é desconsiderado o novo é prestigiado; se a sociedade sofre transitoriedades contínuas é recusado o desatualizado. O que passou não serve, precisa de outro destino. O problema está em como usar os enunciados, tanto para objetos quanto para pessoas. Se a palavra nos faz ser quem somos porque somos também constituídos pela linguagem, então é urgente uma revisão dos conceitos a fim de mudar o paradigma.

Quando há referências positivas à palavra velho, estas podem gerar mais afastamento e isolamento, como é o caso da associação das palavras velho e sabedoria. O velho é cobrado a ser algo que muitas vezes não consegue ser. É praticamente impossível alcançar sabedoria tendo mente ruidosa, ao esforço de ser o que não se é, ao desejar o insignificante.

Atualmente atravessamos a era da informação cujos dados são computados em uma velocidade alucinante, e o que é novo se torna velho em instantes. O que as pessoas muitas vezes não compreendem é que sabedoria é muito diferente de informação. Ram Dass, em seu livro Still Here, explica:

“Informação envolve aquisição, organização e disseminação de fatos. Mas sabedoria envolve outra função crucial: o esvaziamento e quietude da mente, dedicação do coração, e a alquimia da razão e do sentimento. No modo sabedoria, não estamos processando informação, analiticamente ou seqüencialmente. Nós paramos e deslumbramos o todo, discernindo o que é importante e o que não é, ponderando o significado e a profundidade das coisas. Essa qualidade de sabedoria é rara em nossa cultura” .

A teoria da relatividade preconiza o intricado entrelaçamento do tempo e espaço. Segundo Einstein, um não existe sem o outro. O tempo possui forma, portanto se reflete no corpo da pessoa. Isto é, a temporalidade se manifesta na configuração de cada um de nós. O corpo do velho, como o corpo do novo, são corpos no tempo. Vivemos no tempo, porquanto ele está em nós. Kairós contraria julgamentos e imposição de valores. Então, o tempo do velho não é pior do que o tempo do novo, ou vice-versa. Se o tempo é subjetivo, relativo, uma pertença existencial, não há por que razão julgar.

Nossa compreensão sobre o tempo-espaço se torna irrestrita e, portanto, é possível levantar vários questionamentos como: “de onde viemos” e “para aonde vamos”. Se o tempo para nós humanos é simbólico ele pode ser revisto e reconstruído. É urgente pensar por outra perspectiva, pois a idéia de tempo que as pessoas possuem não é uma idéia satisfatória, é angustiante. A opressão da “corrida do tempo” se torna uma das conseqüências de inúmeras patologias debilitantes. A carga alostática (estresse) é acumulada cada vez mais de maneira a causar sérios transtornos na qualidade de vida das pessoas. Enquanto as pessoas persistirem na crença de que precisam “ganhar” tempo, continuarão a sentir a falta dele. O problema do tempo está em como o sentimos.

Será que para ser velho é necessário sentir a vida se fechar para nós? Ou posso ser o velho desde sempre, porque ser novo ou velho é questão de referência temporal? Criamos o tempo cronológico – o tempo do relógio – portanto ter 40 ou 80 anos é um fato que diz respeito às idéias. Posso brincar com as idéias porque elas são imagens que me pertencem. Mesmo que elas não façam parte do imaginário de outras pessoas. Se tudo está na mente tenho liberdade de escolher estar ou não dentro da categoria angustiante de ter certa idade ou ser criativo para reinventar os meus próprios caminhos do tempo. Tudo depende do sujeito que cria a própria narrativa.

Posso ser o velho como posso ser o novo dependendo do momento. O que não é justo para comigo mesmo é estar na mentira de acreditar na juventude eterna. Ferir o meu corpo-alma em prol de uma falsa crença. O abismo da idade será sempre um risco para quem não vê a paisagem de si mesmo.

Quando somos detentores do presente nada resta a não ser experimentá-lo

Boa idade, hoje e sempre!

 

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